Por que ler a vida?
Percebi hoje que ainda não expliquei, e acho que nunca explicarei de modo convincente, por que o título do blog é ler a vida?
Não bastaria curtir a vida, no melhor estilo de carpe diem, ou ainda viver a vida, no sentido de deixa a vida me levar, vida leva eu ?
Parece que a vida tem um pouco mais do que apenas curtir, ou apenas viver. É dessa dimensão, desse sentido mais radical que quero falar quanto coloco esse título no blog. Ler a vida significa tirar as camadas da existência em busca de uma compreensão mais clara do que somos e do que significa ser. Nós somos mesmo uma pergunta radical e nada pode parar esse questionar. Essa força por compreender que somos nós mesmo, esse impulso para uma explicação razoável, um acordo conosco... essa é a leitura que nunca se concluí.
Daniel Lins
29.10.13
terça-feira, 29 de outubro de 2013
quarta-feira, 9 de outubro de 2013
SERVIÇO SOCIAL: PENSANDO SOBRE O ETNOCENTRISMO
PENSANDO EM ETNOCENTRISMO...
“O cidadão norte-americano desperta de um
leito construído segundo o padrão originário do Oriente Próximo, mas modificado
na Europa Setentrional, antes de ser transmitido à América. Sai debaixo de
cobertas feitas de algodão cuja planta se tornou doméstica na Índia; ou de
linho ou de lã de carneiro, um e outro domesticados no Oriente Próximo; ou de
seda, cujo emprego foi descoberto na China. Todos estes materiais foram fiados
e tecidos por processos inventados no Oriente Próximo. Ao levantar da cama faz
uso dos “mocassins” que foram inventados pelos índios das florestas do Leste
dos Estados Unidos e entra no quarto de banho cujos aparelhos são uma mistura
de invenções europeias e norte-americanas, umas e outras recentes. Tira o
pijama, que é vestiário inventado na Índia e lava-se com sabão que foi
inventado pelos antigos gauleses, faz a barba que é um rito masoquístico que
parece provir dos sumerianos ou do antigo Egito.
Voltando ao quarto, o cidadão toma as
roupas que estão sobre uma cadeira do tipo europeu meridional e veste-se. As peças
de seu vestiário tem a forma das vestes de pele originais dos nômades das
estepes asiáticas; seus sapatos são feitos de peles curtidas por processo
inventado num processo inventado no antigo Egito e cortadas segundo um padrão
proveniente das civilizações clássicas do Mediterrâneo; a tira de pano de cores
vivas que amarra ao pescoço é sobrevivência dos xales usados nos ombros pelos
croatas do século XVII. Antes de ir tomar o seu breakfast, ele olha a rua através da vidraça feita de vidro
inventado no Egito; e, se tiver chovendo, calça galochas de borracha descoberta
pelos índios da América Central e toma um guarda-chuva inventado no sudoeste da
Ásia. Seu chapéu é feito de feltro, material inventado nas estepes asiáticas.
De caminho para o breakfast, para para comprar um jornal, pagando-o com moedas,
invenção da Líbia antiga. No restaurante, toda uma série de elementos tomados
de empréstimo o espera. O prato é feito de uma espécie de cerâmica feita pela
primeira vez na China. A faca é de aço, liga feita pela primeira vez na Índia
do Sul; o garfo é inventado na Itália medieval; a colher vem de um original
romano. Começa o seu breakfast com uma laranja vinda do Mediterrâneo Oriental,
melão da Pérsia, ou talvez uma fatia de melancia africana. Toma café, planta
abissínia, com nata e açúcar. A domesticação do gado bovino e a ideia de
aproveitar o seu leite são originárias do Oriente Próximo, ao passo que o
açúcar foi feito pela primeira vez na Índia. Depois das frutas e do café vem
waffles, os quais são bolinhos fabricados segundo uma técnica escandinava,
empregando como matéria-prima o trigo, que se tornou planta doméstica na Ásia
Menor. Rega-se com xarope de maple, inventado pelos índios das florestas do
Leste dos Estados Unidos. Como prato adicional talvez coma o ovo de uma espécie
de ave domesticada na Indochina ou delgadas fatias de carne de uma animal
domesticado na Ásia Oriental, salgada e defumada por um processo desenvolvido
no Norte da Europa.
Acabando de comer, nosso amigo se encosta
para fumar, hábito implantado pelos índios americanos e que consome uma planta
originária do Brasil; fuma cachimbo que procede dos índios da Virgínia, ou
cigarro, proveniente do México. Se for fumante valente, pode ser que fume mesmo
um charuto, transmitido à América do Norte pelas Antilhas, por intermédio da
Espanha. Enquanto fuma, lê notícias do dia, impressas em caracteres inventados
pelos antigos semitas, em material inventado na China e por um processo
inventado na Alemanha. Ao inteirar-se das narrativas dos problemas
estrangeiros, se for bom cidadão conservador, agradecerá a uma divindade
hebraica, numa língua indo-europeia, o fato de ser cem por cento americano.
LARAIA,
Roque de Barros. Cultura: um conceito
antropológico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. 2006. p.106-108.
sábado, 5 de outubro de 2013
FILOSOFIA DO DIREITO - ENTREVISTA MIGUEL REALE JÚNIOR
Excelente entrevista com o Prof e Jurista Miguel Reale Júnior. Discutimos elementos na aula de hoje que foram tratados nessa entrevista. Vale a pena conferir.
Leituras de Setembro 1

Michael Sandel já se tornou conhecido no meio intelectual brasileiro por outras duas obras na área de Direito e Ética. O Primeiro livro a chegar ao Brasil foi JUSTIÇA - o que é fazer a coisa certa. O Segundo, O QUE O DINHEIRO NÃO PODE COMPRAR, e agora, finalmente, CONTRA A PERFEIÇÃO. Os três livros saíram pela Civilização Brasileira e trata de uma reflexão atual sobre os problemas que a nova situação da Engenharia Genética traz numa sociedade individualista e motivada pela eficácia como a atual. O resultado é uma nova eugenia, novas formas de melhoramento do corpo, dos resultados dos esforços, pela via da engenharia genética. As questões morais são muitas, mas chama a atenção o seguinte: que sociedade estaríamos construindo quando alguns podem melhorar seus resultados, uma vez que dispõem de meios financeiros para isso, e outros não?
Conclusão básica: a eugenia amplia a diferença das desigualdades sociais em muitos sentidos e torna os que já são poderosos financeiramente mais poderosos. O novo poder se dá na escolha de características para os filhos, na obtenção de resultados nos esportes (mais músculos, mais saúde, mais velocidade, mais resultado), numa vida que parte da premissa da construção feita pelos pais para com os filhos.
O livro traz boas reflexões e nos leva a questionar, novamente, se podemos fazer realmente algo apenas porque podemos. Qual o limite?
Daniel Lins
O nome é: Bertold Brecht - O analfabeto político
O analfabeto político
O pior analfabeto, é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, não participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida,
O preço do feijão, do peixe, da farinha
Do aluguel, do sapato e do remédio
Depende das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que
Se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia política.
Não sabe o imbecil,
Que da sua ignorância nasce a prostituta,
O menor abandonado,
O assaltante e o pior de todos os bandidos
Que é o político vigarista,
Pilanta, o corrupto e o espoliador
Das empresas nacionais e multinacionais.
Bertold Brecht
sexta-feira, 4 de outubro de 2013
O nome é: Marina Colasanti - EU SEI MAS NÃO DEVIA
Eu sei, mas não devia
Marina Colasanti
Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.
A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.
(1972)
Marina Colasanti nasceu em Asmara, Etiópia, morou 11 anos na Itália e desde então vive no Brasil. Publicou vários livros de contos, crônicas, poemas e histórias infantis. Recebeu o Prêmio Jabuti com Eu sei mas não devia e também por Rota de Colisão. Dentre outros escreveu E por falar em Amor; Contos de Amor Rasgados; Aqui entre nós, Intimidade Pública, Eu Sozinha, Zooilógico, A Morada do Ser, A nova Mulher, Mulher daqui pra Frente e O leopardo é um animal delicado. Escreve, também, para revistas femininas e constantemente é convidada para cursos e palestras em todo o Brasil. É casada com o escritor e poeta Affonso Romano de Sant’Anna.
quinta-feira, 3 de outubro de 2013
Pensando em ética
"Afirmar, à maneira de Maquiavel, que há uma regra para os negócios e outra para a vida privada é abrir a porta para uma orgia de falta de escrúpulos diante da qual a mente recua. Afirmar que não há diferença alguma é estabelecer um princípio que poucos homens que enfrentaram a dificuldade na prática se disporão a aprovar como de aplicação invariável e, acidentalmente, é expor as ideias da própria moralidade ao descrédito, sujeitando-a a uma tensão quase insuportável." R. H. Tawney, cit. por Roberto C. Solomon in Ética e Excelência. Cooperação e integridade nos negócios.
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